Pesquisa da FMRP-USP aponta que Biossensores possibilitam novas abordagens na descoberta de medicamentos
Pesquisadores desenvolveram 13 biossensores luminescentes capazes de testar a eficácia de novos medicamentos “in vitro”.
Pesquisadores canadenses, em parceria com brasileiros, desenvolveram 13 biossensores luminescentes capazes de testar a eficácia de novos medicamentos in vitro. O estudo, publicado na revista Science Signaling, abre caminho para que novas drogas sejam testadas e caracterizadas, uma vez que os biossensores em questão têm como base a atuação de receptores acoplados à proteína G (do inglês G protein-coupled receptors, GPCR) – localizadas na membrana celular com função de comunicação entre as células.
Não é por acaso que o objeto de estudo sejam os GPCRs. Estima-se que entre um terço e metade de todos os medicamentos comercializados atualmente tenham esses receptores como alvo de ação.
“Essas proteínas são alvos de fármacos utilizados no tratamento de um número amplo de doenças, como alergia, dor, hipertensão, diabetes, entre outras. A expectativa é que os novos biossensores atuem também na descoberta e desenvolvimento de novos fármacos para o tratamento de um número ainda mais amplo de doenças”, disse à Agência Fapesp Claudio Miguel da Costa-Neto, professor do Departamento de Bioquímica e Imunologia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP e um dos autores do artigo.
Costa-Neto explica que há alguns anos os testes in vitro para o desenvolvimento de novos medicamentos – realizados antes dos ensaios em modelo animal e em humanos – mostravam apenas se o composto ativava ou bloqueava uma dada resposta celular.
“Fazendo uma analogia, há alguns anos esses testes eram feitos como se houvesse um interruptor que acendia ou não uma lâmpada. Recentemente, vimos que é possível analisar as diferentes vias que podem ser ativadas por um receptor, bem como o quanto uma dada via de sinalização é ativada. Então, não é mais só um liga e desliga. É como se tivéssemos uma sala com várias luzes de LED, ou um dimmer, capaz de dizer quais e quantas vias foram ativadas e, sobretudo, como foi feita essa ativação ou bloqueio. Nossos biossensores, e os outros que estão sendo desenvolvidos por outros grupos, dão uma resposta mais completa, como um perfil de sinalização”, disse.
No estudo, os pesquisadores desenvolveram ferramentas para medir as diferentes vias de sinalização intracelular (biossensores de BRET, do inglês Bioluminescence Resonance Energy Transfer) e detectar a atuação de medicamentos em cultura celular. Isso porque as cascatas de sinalização celular resultantes de interações entre os receptores acoplados à proteína G (GPCRs) e seus ligantes (proteínas) controlam uma ampla variedade de processos intracelulares, tornando-os os principais alvos para a descoberta de novos fármacos.
A equipe internacional de pesquisadores, por técnicas de engenharia genética e biologia molecular, adicionou enzimas fluorescentes e luminescentes (como a luciferase, a mesma encontrada em vagalumes) nas proteínas que interagem com os GPCRs.
“Quando o receptor é ativado pelo fármaco e, portanto, aquela proteína de dentro da célula interage com o receptor, a luz emitida pela luciferase é transferida para a proteína fluorescente e esta é ativada. Com isso, conseguimos medir com precisão diferentes níveis de ação de um fármaco ou medicamento”, disse Costa-Neto.
O trabalho é resultado de uma ampla parceria entre pesquisadores da FMRP, da Universidade de Montreal e da McGill University, no Canadá, e contou com cinco apoios da Fapesp: um Projeto Temático, um projeto selecionado em chamada do São Paulo Researchers in International Collaboration (SPRINT), uma Bolsa de Pesquisa no Exterior concedida à pós-doutoranda Larissa de Bortoli Teixeira, bolsa de doutorado de Sarah Capelupe Simões e também a realização da São Paulo School of Advanced Science on Medicines: from Target to Market, em março de 2018.
Validação
Os 13 biossensores foram testados em dezenas de fármacos e também em vários receptores mutantes – que simulavam polimorfismos correlacionados ou não a doenças genéticas.
“Para validar ferramentas tão importantes para a descoberta de novos fármacos, os biossensores foram testados em diferentes ligantes (fármacos) e também em receptores mutantes. Isso de modo a mostrar que é possível detectar um padrão distinto de sinalização não só quando se usa um fármaco diferente, mas também quando o receptor (a proteína) é alterado”, disse Costa-Neto.
De acordo com os pesquisadores, o estudo consiste em um avanço no entendimento do mecanismo refinado de sinalização, não só pelo número de biossensores desenvolvidos, mas também pela técnica aplicada na pesquisa.
“Já existiam mecanismos como esses que apresentamos, mas fomos mais a fundo no entendimento. Por isso, acreditamos que os novos biossensores terão um impacto grande no desenvolvimento de novos medicamentos. Além de os GPCRs serem um alvo importante, outro ponto é que os biossensores foram extensivamente validados. Mostramos que eles funcionam, respondem bem e que são muito confiáveis para caracterização dessas vias de sinalização”, disse Costa-Neto.
Além da precisão das ferramentas desenvolvidas, Costa-Neto destaca a criatividade como uma das bases do estudo. “Desenvolver proteínas com engenharia genética envolve muito conhecimento e muita criatividade. Alguns desses biossensores são verdadeiros ‘Frankensteins’, compostos pela junção de várias partes estruturais de diferentes proteínas. Foi um estudo bastante criativo”, disse.
O artigo Functional selectivity profiling of the angiotensin II type 1 receptor using pathway-wide BRET signaling sensors, de Yoon Namkung, Christian LeGouill, Sahil Kumar, Yubo Cao, Larissa B. Teixeira, Viktoriya Lukasheva, Jenna Giubilaro, Sarah C. Simões, Jean-Michel Longpré, Dominic Devost, Terence E. Hébert, Graciela Piñeyro, Richard Leduc, Claudio M. Costa-Neto, Michel Bouvier e Stéphane A. Laporte, pode ser lido no site da Science Signaling.
Referência: Jornal da USP – Por: Maria Fernanda Ziegler/Agência Fapesp – Foto: Marcos Santos / Imagens USP