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Projeto investiga rotas de contaminação e gera dados que podem ser usados em programas de redução da infecção hospitalar

A batalha contra as infecções hospitalares desafia autoridades sanitárias em todo o mundo. Para o combate, a Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP recruta alunos de graduação do curso de Ciências Biomédicas. A última equipe treinada, estudantes da disciplina Biotecnologia III, participou do projeto pedagógico Estudo do Microbioma Hospitalar e garantiu mais que aprendizado, desvendando parte da rota de entrada e saída de bactérias no Hospital das Clínicas da FMRP (HCFMRP).

Os alunos da disciplina saíram a campo em coletas nas áreas internas e externas do HCFMRP. E, após avaliação preliminar da diversidade de microrganismos, verificaram que as bactérias presentes nas áreas externas e de maior fluxo – parada de ônibus, entrada de pacientes e ambulatórios – são as mesmas do refeitório e saguão das salas de aulas do Hemocentro (instituição fica em prédio vizinho ao hospital).

 

Projeto pedagógico da FMRP faz parte de consórcio internacional – Foto: cedida pelos pesquisadores

 

Já as bactérias encontradas na recepção do Hemocentro e nos telefones celulares dos alunos que frequentam aulas também no Hemocentro são as mesmas das áreas internas do hospital. As bactérias mais presentes foram as Proteobacteria (44%), Actionobacteria (17%), Firmicutes (13%) e cianobactérias (13%).

Um dos coordenadores do projeto e da disciplina de graduação, o professor Wilson Araújo da Silva Junior acredita que esses resultados sugerem uma possível rota de contaminação, com fluxo direto dessas áreas externas e o hospital, o que pode ajudar no “conhecimento do ambiente principal de transmissão e no desenvolvimento de programas para redução da infecção hospitalar”, comenta.

Aprendizado baseado em projeto

Bárbara Gimenez de Castro, matriculada no quarto ano do curso, já vislumbra os ganhos em participar do projeto. “Aprender mais de uma disciplina, trabalhando no passo a passo do desenvolvimento de um projeto de pesquisa, desde a concepção até a apresentação em congresso, foi uma oportunidade diferenciada.” Ao lado do ganho acadêmico, a estudante afirma que ter contribuído para diminuir ou prevenir o surto de bactérias no ambiente hospitalar “foi uma experiência muito boa”.

Motivar os alunos e levá-los a novas descobertas também têm desafiado educadores, especialmente na área da saúde. Ao usar a metodologia de aprendizado baseada em projetos nessa disciplina, os professores da FMRP acreditam contribuir para o desenvolvimento das “habilidades em biologia molecular e análise genômica e melhorar a qualidade do ensino de genética”, diz o professor Silva Junior.

 

No Brasil, infecções são responsáveis por mais de 100 mil mortes a cada ano – Foto: cedida pelos pesquisadores

 

Esse projeto pedagógico da FMRP faz parte do consórcio internacional MetaSUB (The Metagenomics and Metadesign of the Subways and Urban Biomes) que tem entre seus objetivos o desenvolvimento de abordagens eficientes de coleta e extração de DNA, a otimização dos protocolos de sequenciamento, a descoberta de novos microrganismos, a divulgação da ciência, com o engajamento da sociedade, e a melhoria do uso e planejamento das cidades, com a detecção e quantificação de microrganismos em ambientes urbanos e seus possíveis impactos em saúde pública e biossegurança.

Explica o professor que estão usando na FMRP “o desenho experimental do MetaSUB como uma plataforma básica para melhorar a formação acadêmica dos alunos do curso de Ciências Biomédicas da unidade”.

Relevância do tema para a educação

As infecções hospitalares atingem de 7% a 10% dos pacientes sob cuidados médicos, dependendo do nível de desenvolvimento econômico dos países, entre outros fatores. No Brasil, segundo a Associação Nacional de Biossegurança Nosocomial (ANBio), as infecções são responsáveis por mais de 100 mil mortes a cada ano.

Essas infecções são causadas por grande variedade de microrganismos (bactérias, vírus, fungos, etc). Determinar os tipos desses microrganismos presentes dentro ou nos arredores dos hospitais e a rota de entrada ou saída deles nesses locais têm sido o grande desafio para a comunidade científica.

 

Determinar quais microrganismos estão presentes dentro ou nos arredores de hospitais e sua rota até lá é um desafio – Foto: cedida pelos pesquisadores

 

Comenta o professor que essa foi a relevância utilizada na escolha do tema Infecção hospitalarpara treinar seus alunos em métodos avançados de biotecnologia aplicada à área da saúde. Na execução do projeto, os alunos deveriam “receber todo o embasamento teórico das técnicas e abordagens usadas para a coleta de amostras e obtenção de DNA de alta qualidade em um cenário de alta diversidade de microrganismos, treinamento no uso de aplicativos de georreferenciamento e registro de amostras, amplificação DNA de microrganismos, construção de bibliotecas de sequenciamento e participação nas análises dos resultados gerados”.

Os alunos agora, diz o professor Silva Junior, estão capacitados para desenhar, planejar e implementar um projeto aplicado na área da saúde. Aprenderam a analisar e formular hipóteses que auxiliam a compreensão de fenômenos observados, relacionando-os com potenciais aplicações e usos desta informação. Foram treinados ainda para contribuir na realização de descobertas científicas relevantes em ambiente de interação com grupos internacionais.

Os resultados desse trabalho da FMRP foram apresentados pelos alunos no ano passado no The 2018 MetaSUB Conference, na Praia do Forte, Bahia, e durante o Congresso Internacional de Genética, em Foz do Iguaçu, Paraná. Os estudantes trabalharam sob orientação dos professores Aparecida Maria Fonte, Nilce Maria Martinez-Rossi e Vanessa da Silva Silveira, além do professor Silva Junior, todos do Departamento de Genética da FMRP e coordenadores da disciplina Biotecnologia III.

 

O graduando Carlos Eduardo Milani Neme apresentou o trabalho no Congresso Internacional de Genética em 2018 – Foto: cedida pelo pesquisador

 

Integraram a equipe do projeto: Carlos Eduardo Milani Neme e Bárbara Gimenes de Castro (que apresentaram o estudo nos dois eventos) e, ainda, Aline Seiko Carvalho Tahyra, Bruno Mari Fredi, Camilla Rizzo Nappi, Daniele Enriquetto Mascarelli, Douglas dos Santos, Fernanda Santos de Oliveira, Flavia Pereira Freire, Giulia Ballestero, Julia Beatriz Menuci Lima, Juliana de Andrade Bolsoni, Juliana Lourenço Gebenlian, Naira Lopes Bibo, Nathália Soares Silva, Nilton de Carvalho Santos, Queren Apuque Alcantara, Victoria Simionatto Zucherato, Gilberto Gambero Gaspar, Maria Fernanda Zaneli Campanari, Rafael Correa da Silva, Daniel Guariz Pinheiro, Emmanuel Dias-Neto, Valdes Bollela Roberto, Vanessa da Silva Silveira, Aparecida Maria Fonte, Nilce Maria Martinez-Rossi, Wilson Araújo Silva Jr.  Atualmente o grupo prepara artigo para publicação em revista científica da área.

A colaboração acadêmica e clínica ficou a cargo do professor Valdes Bollela Roberto, do médico Gilberto Gambero Gaspar, do HCFMRP, e do pesquisador Emmanuel Dias Neto, do Centro Internacional de Pesquisas do A.C. Camargo Cancer Center em São Paulo. O suporte técnico e científico foram do Centro de Medicina Genômica (CMG) do HCRP e Fundação Hemocentro de Ribeirão Preto (FUNDHERP).

Referência: Jornal da USP – Rose Talamone e Rita Stella – Foto de capa: Cedida pelos pesquisadores